sexta-feira, 20 de março de 2009

Em Um(a) Mudo(a) De Sentimentos

Apenas no mood. Nada muito promissor; apenas aquela sensação durante um curto período de tempo que sabe-se lá quanto vai durar, se durar.

É tudo muito assim. Talvez por nossos pensamentos viajarem muito mais rápido que o tempo necessário para sairmos da inércia. E assim ficamos apenas no mood. Sentimos que queremos algo, mas com aquela sensação tão intensa e tão curta que, no momento seguinte: drástico contraste. Estamos mudos, no mud.

Aquele dejà vu sentimental; aquele cheiro que remete a uma sensação que, por uma fração de segundo lhe parece intimamente familiar mas, na fração seguinte lhe é totalmente estranha; ou aquele trecho da música que lhe parece injetar uma dose de adrenalina, mas depois percebe-se que foi apenas efeito placebo.

O velho duelo da racionalidade e a emotividade subitamente parece mais amigável pois, para sentirmos algo, temos que saber que sentimos. A todo momento mudamos o mood e, ao tentar encontrar alguma explicação, mutamos. Caímos no conflito de tentar simular o momento imediatamente anterior e logo desistimos, a ponto de jurar que nada aconteceu e que tudo pareceu. É como sonhar que estamos sonhando: não temos certeza do que realmente é real, acordamos sem saber se realmente acordamos. Pior: sonhar que estamos dormindo e sonhando com este sonho, estando assim eternamente presos às nossas ilusões.

E, por fim, lembramos que, de tempos em tempos, tudo cai no esquecimento.


terça-feira, 3 de março de 2009

Atual e Usado - Um Prelúdio para a Fuga

O que há de novo?
Na nova idade, a rotina.
Tudo de novo de novo.
Vidas e idas e vindas e ternas.
E a pesar os pesares,
Medir milhas e mares,
Nada vale apenas.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009




Diante da fileira de jovens americanos, dispostos em frente ao Pentágono, está a bela moça chamada Jane Rose Kasmir empunhando uma flor branca e vestindo um manto do mesmo símbolo que carrega. Está foto é uma das mais conhecidas do fotógrafo Marc Riboud que captou o ar sereno dessa mulher em busca da paz e do fim da guerra do Vietnã.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

floco

Um floco de poeira vacilante na rua segue, com uma velocidade constante, o vento que vem do sul. As várias superfícies que já esteve um dia, mudam conforme o clima, as famílias, as guerras e os acasos. Sua forma, de minúsculas faces, também não é definida e se transforma incansavelmente. Em uma dessas mudanças, ele pousa na beirada de um copo – permanece ali por 4 horas e 31 minutos até que um jarro de água empunhado por um homem de camisa branca despeja 347 ml de substância aquosa. A boca ferida pelo frio que atinge a cidade naquele inverno se aproxima de maneira gravitacional para a exata coordenada borda do copo que se encontra o floco de poeira.

A mão vestida por uma luva de lã azul-marinho derrama o resto d’água que restou no copo na pia de sua cozinha, e se estica para fechar a pequena fenda de janela que se encontra um pouco acima da torneira vazante. Durante a ação se recorda da dor que sente na articulação do braço direito. Em dias frios B. sente mais dor do que de costume. Lembra que seu remédio acabara – seu filho está na casa da mãe e dessa vez não poderá sair de casa para comprar o remédio do pai. V. nascera com 3,4 quilos, um bebê saudável, mas ultimamente sofre de constantes anemias. B. está preocupado, parece estar esquecido no mundo, há 3 dias que ninguém liga para ele; nem suas faltas no trabalho fazem o incomodo sino telefônico soar. Parece que sua tática de isolamento realmente funcionou – sonhara na noite anterior que, após um regado café da manha e do barulho costumeiro do jornal envolto por um saco de plástico lançado sem mira prévia na sacada de sua porta, estava sentado confortavelmente a frente de sua lareira de tijolos escuros e observa a notícia de seu funeral, o jornal tem folhas de grande dimensão que faz a manchete ter o triplo do tamanho usual. Aquilo já estava o afetando. Dispensara a faxineira. Y. vem todas as segundas e quartas para manter a casa com o mínimo de conforto, mas mesmo assim são raros os dias que a casa parece respirar um ar mais alegre e confortável. Talvez seja as cortinas vinho escuro. B. não gosta de abri-las e em vez de vedar o sol ela transforma a sala em uma constante fonte avermelhada, iluminando tudo com a embriaguez de um vinho barato.

V. observa o monte de jornais na frente da casa, um jarro se encontra quebrado e a flor não parece se incomodar com o chão gelado. O garoto toca a campainha. Ninguém responde. A ponta do dedo indicador que acabara de ser responsável pelo som agudo se encontra suja. V. se vira e começa a descer os três degraus que ligam a calçada à sacada de seu pai, acompanhando o movimento dos pés ele posiciona o mirrado dedo a sua frente, que seguindo o resto do movimento corporal, acaba por indicar o triste céu nublado. V. expira o pouco ar de seus pulmões contra seu dedo.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Reflexo Em Si


É inevitável pensar em si sem pensar nos outros. Ao escrever este texto, por exemplo, de certo que penso nas reações geradas naqueles que o lêem; penso nas reações que gostaria que eles tivessem; penso nas reações que else gostariam que eu tivesse.

Estamos encurralados em diversos níveis de pensamentos. Geralmente, nossos pensamentos se resumem ao que é mais supérfluo, o que aparenta na superfície. Deixamos escapar a profunda relação das imagens que criamos com a própria imagem dessa criação. Assim como na figura acima, observamos tanto o que é opaco quanto o que reflete totalmemente. O que está no meio de toda a percepção é o que continuamente deixamos escapar. Por que pensamos? Pensamos que pensamos. Na metareflexão, representada pela esfera central, tudo é refletido, a esfera opaca, a esfera reflexiva, a mesa (que, por sua vez reflete as três esferas) e o próprio desenhista, o criador de toda essa imagem.

Quantas vezes nos pegamos circulando em pensamentos e pensando em círculos? Quantas vezes não sabemos diferenciar o que vemos do que queremos ver? Existe alguma diferença entre o observador NA litografia de Escher e o observador DA litografia de Escher?

É natural pensar que estamos "um nível acima" do tão capcioso desenhista que aparece NA figura (que, aliás é o próprio Escher (nossa, até quantas camadas de pensamento podemos resistir?)), assim como é comum a nossa percepção eucêntrica das coisas.

O cerne da inteligência reside em saber o que ela é de fato. Saber que sabemos. Mas será que podemos saber que sabemos que sabemos? Podemos escrever um texto que se escreve ou desenhar uma figura que se desenha?

De fato é possível desenhar uma figura que desenha a si mesma, como clama Escher pouco mais abaixo! Nosso cérebro também é humano e absorve mais facilmente o que lhe é mais cômodo. O seu obviamente foi direto às figuras antes de ler o texto e constatou que, mesmo contrariando a ordem "natural" (no caso de cima pra baixo), não resistimos à tentação das gravuras antes de queimar milhões de neurônios para interpretar cada delíneo preto (e, por que não, os espaços em branco?) que forma(m) cada letra, cada palavra e cada frase para, no fim, queimar outros benditos milhões para interpretar a língua e o significado por trás. É de um esforço reconhecedor a nossa capacidade de criar uma noção ética para a vida, a disciplina para ler os textos antes de ver as figuras, a capacidade de pensar no outro antes de si, e; por fim, de sermos vencidos por nós mesmos (ou pela nossa parte não-controlada ou não-pensante) e pensar que podemos... pensar que pensamos.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

( . . . )

O instrumento pensante um pouco acima do meu pescoço dispara, incansavelmente, fluxos acionais de tudo que me envolve.
Nesse momento o que me ocupa se liberta. É o cheque que futuramente será preenchido por um valor que desconheço; é o sabor do biscoito que agora como; é o possível motivo que provoca um latido de cachorro em minha rua; é o próximo pensamento que agora tende a minguar. Pois eles só vivem se forem vivos dentro de mim, sem o controle meu do que é meu.

sábado, 26 de julho de 2008

REAL

Isso aconteceu.
Do chão da calçada sinto os raios reluzirem sobre mim.
Pegam-me, abruptamente, e me carregam como um indigente.
Sacudo até ser largado.
Minha cara, pelos maus tratos e anos sem descanso, já se assemelham a de uma velha coroa.
Logo me soltam e estou livre novamente.
Circulando.
Matando.
Felicitando outros.
Provocando desejos.
Um dia Arnaldo deu a seu filho.
Aquela coisa.
Empurrado, a força, para dentro do escuro aparelho digestivo do suíno rosa.
Fiquei.
Esperando.
Perdi meu valor.
E, agora, já não sou real.